sábado, 27 de fevereiro de 2010

Educação, uma questão de centralidade

Ruy Martins Altenfelder Silva*

Ainda no rescaldo da virada de ano, época propícia a reflexões e a preparar a famosa lista dos bons propósitos para temporada que se inicia, não posso me furtar a examinar dois temas aos quais dedico especial atenção e cuja centralidade no debate sobre os rumos da nação só vem sendo confirmada nos oito meses em que estou à frente do Conselho de Administração do CIEE.

Trata-se da educação e da inclusão profissional dos jovens, aliás, temas quase tão ligados como irmãos siameses. Inicialmente, causa espanto que, num país onde as deficiências do ensino são reconhecidas e lastimadas há décadas, as também inevitáveis listas de personalidades de destaque, publicada pela mídia nos balanços do ano que se finda, apenas registrem um ou outro nome lincado a essa estratégica questão – e, assim mesmo, quase sempre em referência a ações beneméritas. Ou seja, nada que se pareça nem de longe com o embrião da urgente revolução educacional, essencial para se atingir o tão falado desenvolvimento sustentável. Fato menor na ordem das coisas, mas ilustrativo da dúbia posição da sociedade em relação ao descalabro da educação.

Todos criticam, todos lamentam, todos protestam. Mas quase todos ficam apenas nisso, já que há um punhado de abnegados – e conhecemos vários deles – que se empenham num combate quase que solitário em favor da educação. Os resultados, entretanto, continuam inglórios, com especialistas atribuindo o insucesso à ausência de uma política nacional de educação consistente e afinada à realidade atual e futura.

Sem entrar na polêmica se faltam recursos para a educação ou se eles são mal gastos, não há como negar que há necessidade de uma mudança urgente, diante dos dados negativos divulgados com preocupante regularidade. Por exemplo, no relatório Educação para Todos, recém divulgado pela Unesco, o Brasil aparece em 88ª posição entre os 128 países pesquisados, atrás da Argentina e Paraguai . As boas avaliações obtidas em três dos quatro indicadores (taxa líquida de matrícula no ensino fundamental, índice de analfabetismo e igualdade entre meninos e meninas) foram derrubadas pelo baixo número de alunos que chegam à quinta série do fundamental.

A alta taxa de evasão escolar e a defasagem etária emitem fortes sinais de alerta. O estudo Juventude e Políticas Sociais do Brasil, publicado pelo Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea), detecta que 18% dos jovens entre 15 e 17 anos estão fora da escola – e não é difícil prever os obstáculos que a baixa escolaridade representará no acesso deles a um mercado de trabalho cada vez mais sofisticado e mais competitivo, no qual a produtividade é um diferencial que pode significar até a sobrevivência profissional.

O despreparo profissional do jovem é apenas um dos lados do problema e remete para uma pergunta auto-explicativa em sua resposta: com um capital humano de baixa qualificação profissional, como os setores produtivos e o mercado consumidor poderão crescer e se solidificar, assegurando a tão sonhada sustentabilidade socioeconômica? Segundo Márcio Pochmann, presidente do Ipea, o Brasil chegou tarde à execução de políticas públicas para a juventude, o que resultou num conjunto perverso de problemas juvenis, que mescla despreparo para o trabalho, baixa escolaridade, altas taxas de violência, aumento dos casos de gravidez precoce, necessidade de ajudar no orçamento familiar, entre outros.

Algumas medidas oficiais mostram que a questão não é insolúvel, desde que haja vontade política de vencer o desafio. Por exemplo, o Brasil praticamente atingiu a universalização do acesso ao ensino fundamental e, enfrentando a natural aversão nacional por avaliações de mérito, o governo paulista decidiu realizar provas anuais para medir a capacitação dos professores temporários que atuarão nas escolas neste ano (dos 184 mil inscritos para prova de seleção para ministrar aulas nas cerca de 5,3 mil escolas estaduais, 88 mil não conseguiram a nota mínima de 5 pontos) e anunciou um plano de carreira que possibilitará reajustes salariais por desempenho.

Sem dúvida, alguns passos à frente, mas ainda insuficientes para uma efetiva correção de rota, que implicará uma profunda revisão da grade curricular, hoje desvinculada das exigências do mercado de trabalho e do universo jovem. Basta lembrar que milhares de escolas não contam sequer com um computador para introduzir seus alunos nos segredos da informática, hoje um requisito básico para quem quer entrar no mundo do trabalho. Nessa vertente é que desponta aquele punhado de abnegados que lutam para colocar a formação dos jovens no caminho correto, como é o caso dos milhares de parceiros do CIEE, que abrem suas portas para estagiários e aprendizes, com índices de efetivação acima de 60%, numa demonstração exemplar de que unir teoria e prática é o melhor caminho para qualificar futuros talentos e aprimorar o capital humano, que sem dúvida será a grande riqueza do País.

*Ruy Martins Altenfelder Silva é presidente do Conselho de Administração do Centro de Integração Empresa-Escola (CIEE) e do Conselho Diretor do CIEE Nacional.

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